domingo, junho 18, 2006

O poeta visual do Nordeste

José Nêumanne Pinto

Paraibano de Sapé, Reginaldo Marinho é, principalmente, o fotógrafo em preto e branco da paisagem e dos hábitos nordestinos. Quem conhece seu trabalho a respeito da região a que está ligado umbilical e atavicalmente, não tem a menor dúvida em descobrir sua identidade. A luz rústica rebatida nos objetos captados por sua lente é aquela luz dura e cegante que coalha a lama no sertão nordestino, transformando o chão em pedra rachada. Reginaldo é o poeta visual do Nordeste – como Zé Ramalho é seu poeta oral – porque vive a nordestinidade em sua plenitude, não como um dado exótico de sua visão poética do mundo, mas como uma informação, biográfica essencial de sua própria formação de artista.


Talvez por isso mesmo, o fotógrafo paraibano tenha, captado, com tanta emoção, os flagrantes da redescoberta da democracia na Espanha, ou melhor e mais precisamente, como exigiria Luís Llach, na Catalunha. Reginaldo Marinho deixou os espaços de Niemeyer e Lúcio Costa, pelos quis tinha abandonado as paragens sertanejas, para viver 1977, em Barcelona, terra da luxuriante arquitetura de Gaudi.

Fotógrafo do dia a dia, convicto repórter da vida comum, acompanhou com atenção o nascer da vida democrática na Espanha, durante a morte do falangismo franquista, sem que sua câmera deixasse de perceber no rosto do homem comum mudança a mudança nos vincos de sua pele curada em 39 anos de ditadura. A atenção do repórter deu-lhe o instrumento. Mas foi a alma de nordestino que lhe permitiu beber a emoção do momento em cada gesto imobilizado pelo diafragma de sua arma permanentemente apontada para as ruas catalãs.

O espectador atento perceberá no trabalho fotográfico de Reginaldo Marinho a mesma fusion Espanha-Nordeste, que poderá ter percebido quando viu – se viu – o filme O Passageiro, de Michelangelo Antonioni ou quando percebeu no grito do muezim catalão Luís Llach os mesmos aboios chorados que o amuandim cearense Raimundo Fagner registrou em seu LP antológico Traduz(c)ir-se. Existem entre Barcelona e Sapé muito menos diferenças do que poderiam supor nossos vãos mapas do mundo.

2 Comments:

Blogger \o/ said...

Muito interessante o seu blog! gostei do seu trabalho! parabéns! abçs

http://criandoespacos.blogspot.com

18/7/06 4:06 PM  
Blogger ImagemDigital said...

Obrigado. Aqui também é um lugar diferente.

27/7/06 8:09 AM  

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